Em sua cruzada contra o meio ambiente, o presidente Jair Bolsonaro já perdeu. O que acaba de ocorrer —as queimadas no Brasil como principal notícia no mundo— é uma derrota por nocaute do discurso a Amazônia é nossa. Domesticamente, o presidente também perdeu apoio de líderes ruralistas, que temem as sanções comerciais da Europa.
Seu pronunciamento em rede nacional,
feito na quinta, lembrou aquelas imagens do soldado entrincheirado
levantando a banderinha branca; a batalha perdida. Bolsonaro rendeu-se
às críticas e declarou “seu profundo amor e respeito pela Amazônia.” E
mais: prometeu tolerância zero com o desmatamento ilegal.
Porém,
o turbilhão de críticas a seu discurso antiambiental pode estar longe
de acabar. As queimadas vão continuar, ou até piorar, em setembro
—historicamente, o mês mais seco na Amazônia—. Em outubro, o sínodo dos bispos da Pan-Amazônia, convocado pelo Papa Francisco, deve trazer mais críticas a Bolsonaro.
Depois
disso, em novembro, virão os dados finais do INPE sobre o desmatamento.
E, aí, preparem-se: tudo indica que estes serão os piores números em
muitos anos.
É interessante notar que desde que ensaiou
os primeiros ataques ao meio ambiente, Bolsonaro encontrou uma reação
mais forte do que esperava. Queria acabar com o Ministério do Meio
Ambiente? Teve que recuar, seguindo conselho da própria bancada
ruralista. Falou que ia deixar o Acordo de Paris? Ouviu do próprio ministro Ricardo Salles que não era bom negócio.
Agora os golpes mais fortes chegaram. Na semana passada, a Alemanha e a Noruega anunciaram o congelamento de suas doações ao Fundo Amazônia. Macron chamou Bolsonaro de mentiroso
e o fim de semana promete ser quente com os líderes da França,
Alemanha, Reino Unido e Canadá malhando o Brasil na reunião do G7.
Ontem,
milhares de pessoas em todo mundo saíram às ruas para protestar contra
as chamas na Amazônia. Em quase todas as capitais do país houve
panelaço. Disso Bolsonaro pode se orgulhar: de ser talvez o primeiro
presidente a mobilizar uma resistência tão vocal contra o avanço do
desmatamento.
Mas como isso vai mudar o que está
acontecendo nas matas e campos da Amazônia? Com Madonna, Cristiano
Ronaldo, Leonardo Di Caprio e o resto do mundo tuitando #PrayforAmazonia
pode parecer que finalmente os ambientalistas ganharam a luta pelos
corações e mentes. No entanto, é difícil imaginar que o pecuarista, o
assentado ou o madeireiro deixarão de limpar seu pasto, fazer a roça e puxar a madeira porque algum gringo está chiando no Instagram.
Na
prática, o modelo econômico para a Amazônia representado pelo Governo
Bolsonaro está ganhando. O crescimento vertiginoso das queimadas na
região Norte —145% até 20 de agosto— está provando aquilo que o sistema
de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter) já havia indicado:
forte pressão sobre a floresta. No caso dos alertas, o presidente atacou o INPE,
desqualificou os dados e demitiu o diretor do instituto. Já para se
livrar da responsabilidade de seu Governo nas queimadas, acusou ONGs e
governadores.
As crescentes derrubadas nunca foram
invisíveis aos satélites, e apenas agora Bolsonaro prometeu combate ao
crime ambiental. De fato, a devastação, cuja expressão máxima é a fumaça
tomando conta do continente, não vai parar se o Ibama não voltar a
fiscalizar e multar. O roubo de madeira, a grilagem de terras públicas, o
garimpo ilegal e a invasão de terras indígenas são os grandes negócios
do momento na Amazônia.
Acima de tudo, o aumento do desmatamento significa que o Brasil começa a desrespeitar o Acordo de Paris. Está previsto em lei
que até o ano que vem deveríamos reduzir em 80% as emissões do
desmatamento em relação a uma média de 2005 a 2012. Estávamos no caminho
para de fato provar ao mundo que o Brasil sabe cuidar de suas
florestas. Mas este golaço agora parece improvável.
Com a
reversão da trajetória positiva do combate ao desmatamento (iniciada
ainda sob o Governo de Dilma Rousseff em 2012), a Amazônia pode deixar
de ser um grande sorvedouro de gás carbônico e transformar-se, com suas
gigantescas queimadas, em uma grande fonte de poluentes. Mais gases de
efeito estufa vindos da floresta acabam com nossas chances contra o
aquecimento global. Neste caso, todos perderemos.
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Gustavo Faleiros
El País
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