Parte do Congresso Nacional tem demonstrado boa vontade com relação ao pacote econômico enviado pelo Governo Jair Bolsonaro ao Legislativo nesta semana. Mas há resistências até entre os apoiadores das três propostas de emendas constitucionais entregues na terça-feira pela equipe de Paulo Guedes. A principal crítica é a de que faltou povo nas propostas, ou seja, faltaram ações sociais que visem diretamente a população pobre e extremamente pobre —esta última faixa atingiu 13,5 milhões neste ano.
“Não
podemos esperar uma hipotética melhoria na economia para reduzirmos a
desigualdade”, afirmou o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), um
dos congressistas que elogiou a maior parte do pacote. E completou: “A
tese de esperar o bolo crescer para, depois dividir, não funcionou no
passado e não funcionará agora”
Um item que foi pouco notado entre os parlamentares é o que desvincula o Benefício de Prestação
Continuada (BPC) do salário mínimo. Esse benefício é regido pelo artigo
58 da Constituição. É pago para idosos ou portadores de necessidades
especiais cuja renda familiar seja de um quarto de salário mínimo per
capta. Sua revogação, que já foi tentada pelo Governo Bolsonaro sem
sucesso na reforma da Previdência, agora está prevista no artigo 8º,
inciso VII da PEC do Pacto Federativo. Ou seja, se aprovada a PEC, o BPC
poderá ser inferior a um salário mínimo.
Entre os
congressistas, também há os que criticam a medida que pretende reduzir
em um quinto o número de municípios brasileiros, os que reclamam da
fusão dos gastos mínimos obrigatórios da saúde com a educação, da
inclusão dos gastos com os inativos nessa contabilidade (ainda que o
Governo tenha prometido recuar deste item), e os que se queixam da
proteção de categorias consideradas a cúpula do funcionalismo público
nos casos de crises econômicas. Uma das PECs, a Emergencial, prevê o
congelamento da ascensão funcional de todos os servidores, excetuando-se
os magistrados, membros do Ministério Público, diplomatas, militares e
policiais.
“De maneira geral, as medidas são positivas
porque elas dão flexibilidade ao gestor. Mas incluir os gastos com
inativos no mínimo de saúde e educação é uma excrescência”, avaliou o
deputado Felipe Rigoni (PSB-ES). Uma análise preliminar elaborada por
técnicos de um gabinete compartilhado entre Vieira, Rigoni e a deputada
Tabata Amaral (PDT-SP), mostra que, apesar de considerarem o atual
pacote positivo, ainda falta um pedaço da proposta econômica.
Na
avaliação desses técnicos, para entender onde o Governo Bolsonaro quer
chegar, ainda é preciso aguardar o envio das reformas administrativa e
tributária, do projeto de geração de empregos e da nova lei das
privatizações. Dizem, por exemplo, que todas essas medidas estão
conectadas porque envolvem geração de receitas ou diminuição de
despesas. Juntos, eles elaboram, com a bênção do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ),
uma série de projetos de lei com o objetivo de amenizar a dureza das
medidas liberais e que leva em conta cinco eixos: a garantia de renda
dos mais vulneráveis, a inclusão produtiva, atualizar a rede de proteção
ao trabalhador, melhorar o acesso ao saneamento básico e à água e a
criação de uma lei de responsabilidade social.
Propostas inconstitucionais
Por
outro lado, estudos elaborados por técnicos das bancadas da oposição da
Câmara e do Senado mostram que o pacote contém medidas
inconstitucionais porque já foram rejeitadas recentemente durante o debate da Previdência.
Entre elas estão: a tentativa de suspender o repasse do Fundo de Amparo
ao Trabalhador para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES) e a proibição de conceder reajuste real ao salário por
até dois anos. Uma proposta legislativa uma vez rejeitada ano não pode
ser reapresentada pelo período de um ano. Essas sugestões já foram
recusadas pela Câmara durante a aprovação da reforma da Previdência.
Os
opositores, que dizem preferir debater uma reforma tributária ao atual
pacote econômico, batizaram as medidas de “PECs da Agiotagem”. “Tudo o
que houver de economia, o recurso será destinado para o pagamento da
dívida pública. Ao invés de se investir em saúde, por exemplo, vai pagar
o capital financeiro”, reclamou a líder da oposição na Câmara, Jandira
Feghali (PCdoB-RJ).
Outro ponto que está distante do
consenso é o trecho da PEC do Pacto Federativo que prevê a extinção de
até 1.254 municípios que tem menos de 5.000 habitantes e arrecadação
própria menor que 10% de sua receita total. “Há medidas que não merecem
nesse primeiro momento o nosso endosso, como a previsão de extinção de
municípios, que afetaria muito Minas Gerais. Vamos analisar tudo de
forma aprofundada”, afirmou o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), que
elogiou as demais propostas de Guedes.
“Essa proposta de
extinção dos municípios foi colocada como moeda de troca. O Governo vai
barganhar com ela. Vai dizer que foi bonzinho em retirar o bode da
sala”, avaliou o líder do PSOL na Câmara, Ivan Valente.
A
alegação dos governistas é simplesmente econômica. “A extinção de
municípios de até 5.000 habitantes é uma importante medida para reduzir
gastos desnecessários e reverter em serviços públicos para a população”,
afirmou o deputado Carlos Jordy (PSL-RJ), por meio de seu Twitter.
A
Confederação Nacional dos Municípios, entidade que reúne os prefeitos
das 5.568 cidades brasileiras, tem um cálculo distinto do Governo. Diz
que, por esses critérios, 1.220 correm o risco de serem reincorporados a
outros e queixa-se de que, “ao propor a extinção desses municípios, há
grande equívoco e falta de conhecimento acerca da realidade brasileira”.
“Os principais indicadores a serem considerados devem ser a população e
os serviços públicos prestados”, diz um texto assinado pelo presidente
da entidade, Glademir Aroldi.
A CNM ainda ressalta que a
sugestão é inconstitucional, já que a Constituição prevê que a
emancipação e a fusão de municípios dependem de plebiscito com a
população que vive em seu território, e não da aprovação de uma nova
legislação federal.
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Afonso Benites
Brasília
El País
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